segunda-feira, 4 de abril de 2016

NISA: A Porta da Vila nos anos 40

A Porta da Vila não está no roteiro da toponímia “republicana” do burgo, mas podia estar. O largo foi desde sempre, o principal ponto de encontro dos nisenses, principalmente da população rural, não só por ser a “linha de fronteira” natural entre a Matriz e o Arrabalde, mas por se situarem aí as principais referências comerciais da vila.
Quase todos os estabelecimentos, grandes ou pequenos que vieram a despontar em Nisa, tiveram a sua rampa de lançamento no designado Largo Serpa Pinto. Depois, conforme o êxito e progresso do negócio foram procurando outras artérias, mais consentâneas com o alargamento do espaço e da oferta de produtos.
Nos anos 40 e até finais dos anos 60 do século passado, muitas foram as firmas comerciais que passaram pela Porta da Vila, dando ao largo um permanente movimento e um frémito de vida que, a partir dos anos 70 se começou a desvanecer.
Ali nasceu, por exemplo e como augúrio de um tempo novo, pós guerra, que não chegou a materializar-se em terras portuguesas, o primeiro café de Nisa. Designava-se “Restauração” e foi inaugurado em 1 de Dezembro de 1945. Ali despontou também a Cervejaria do senhor António Alberto, um “monumento” de simpatia e que muitos nisenses recordam com saudade e uma imagem de carinho e ternura.
No largo e junto à padaria de João Mendes, se iniciaram os protestos sobre o racionamento do pão e que iriam levar a uma onda de repressão que se transformou numa das páginas mais negras da história de Nisa: a greve (ou revolta) do pão, em 12 de Dezembro de 1943.
Ali se realizou, anos depois do 25 de Abril, em 1981, uma grande manifestação, talvez a maior, em Nisa, de gratidão e reconhecimento, com a inauguração do busto ao Dr. António Granja, médico dos pobres e republicano assumido. O largo passou a ostentar, como homenagem, o seu nome
Não tinha muita luz, a Porta da Vila, nesses anos da década de 40. Um candeeiro central, ladeado por lindo canteiro de flores, iluminava, tenuemente, todo o largo, o que conferia ao espaço a imagem de uma praça medieval.
As casas tinham todas moradores, a maior parte residindo por cima dos espaços comerciais que exploravam.
Não havia a “febre automobilística” dos dias de hoje. A Porta da Vila era um lugar de passagem, permanência e convívio. Convívio esse, quase sempre vigiado, principalmente à noite, não se permitindo “ajuntamentos”.
A liberdade de movimentos era vigiada, ainda assim não faltava a alegria e o bulício de uma vila que mostrava alguma expansão e vontade de trilhar um rumo de futuro para os seus filhos.
Hoje, são poucas as lojas da Porta da Vila. As casas, na sua maioria estão fechadas, outras mostram sinais evidentes de desleixo e abandono. Não seria difícil à Câmara, ao abrigo da lei, sensibilizar ao menos os proprietários para que caiassem as frontarias dos prédios e devolvessem ao largo onde “mora” o Dr. Granja um pouco da brancura e alegria que teve noutros tempos.
O principal monumento de Nisa está ali. O espaço contíguo não pode dissociar-se desta realidade. É urgente um novo rosto para a Porta da Vila.
Quem aceita o desafio?
Mário Mendes - 8/11/2010