terça-feira, 30 de agosto de 2016

Cruz Malpique, um pedagogo nisense

Em louvor dos trabalhos manuais
1 - A criança não se contenta com imaginar teoricamente. Acha isso muito pouco. Do imaginar ao realizar, quase não deixa espaço. O dito e feito, o imaginado e realizado, assumem, nela, o efeito de uma irresistível pressão. Quer ver logo tudo concretizado. Quer seja ela própria, ou em colaboração com outras crianças, a executora dos planos sonhadores. Se imaginou aspectos da vida selvagem - e a televisão hoje lhe dá abundantes sugestões -, logo os quer viver com outras crianças. E se, acaso, fantasia alguma máquina, alguma casa, algum artefacto, logo reclama martelo, madeira, pregos, tesouras, facas, argila, areia, e ó mãos para que vos quero! Como disse Stanley Hall, padre mestre nas coisas da psicologia infantil, nunca a mão esteve mais perto do cérebro do que nessas idades.
O manualizar, o fazer concretamente, o transitar da imaginação à prática é uma das mais patentes dimensões espirituais da criança.
2 - A criança é uma forma abreviada da evolução da humanidade. O homem, antes de ser homo sapiens, foi homo faber, homo manualis. Antes de teorizar, comprovou-se em fazer (1). Assim o homem nos seus primórdios, e assim também a criança nos dias de agora. O sábio dizia: dêem-me um ponto de apoio, e eu levantarei o mundo. A criança é como dissesse: dêem-me possibilidades e oportunidades de eu fazer, pelas minhas próprias mãos, com ferramentas mais ou menos improvisadas, este mundo e o outro, e eu serei feliz, não saberei o que é um momento de tédio, não darei pela passagem do tempo. A inteligência da criança não se processa no mundo do abstracto, mas no mundo do concreto. Para vir a dar, com eficiência, o salto ao mundo, puramente intelectivo, precisa do trampolim dos trabalhos manuais.
(1) - Saber é fazer, no que respeita a trabalhos manuais. E estes não se fazem por correspondência. E preciso sujar as mãos, em flagrante exercício. Já Herculano dava prioridade ao ensino técnico sobre o meramente literário. E que o primeiro era o do aprender fazendo, ao passo que o se­gundo era o dos flatus vocis, o do palavreado, constituído por cheques sem cobertura no banco da experiência.
Cruz Malpique - Em louvor dos Trabalhos Manuais. Labor, Revista do Ensino Liceal, N.º 301, Aveiro, Abril de 1972.

Amável Silva, um montalvanense ilustre

Em 20 de Janeiro de 1909 nascia em Montalvão este ilustre Homem de Letras que, se fosse vivo, completaria agora 100 anos de idade. Trata-se da figura que todos os anos pelo 5 de Outubro é homenageada na Escola Garcia d’ Orta de Castelo de Vide, através da atribuição de prémios, com o seu nome, destinados aos alunos que mais se distinguiram neste estabelecimento de ensino.
Apesar de ter nascido naquela localidade do Concelho de Nisa, Amável Silva veio morar para Castelo de Vide com apenas um mês de vida, daí que se considerasse um genuíno castelovidense. Era filho do casal de professores Primários, de seus nomes Severiana e António Silva, ambos de Castelo de Vide. Aliás ambos exerceram na vila e muita gente ainda se recorda destas duas figuras que ensinaram tantos e tantos castelovidenses e não só.
Depois de ter estudado em Portalegre, Amável Silva foi para Lisboa onde, na Faculdade de Letras, se licenciou em Germânicas. Ainda na capital portuguesa foi professor de Liceu e posteriormente no Instituto Comercial. Sabemos também que esteve em Inglaterra a especializar-se na sua profissão.
As férias passava-as em Castelo de Vide na casa de família situada na Rua 5 de Outubro (ou dos Escudeiros). Aliás Amável Silva era uma pessoa muito ligada a esta vila, onde tinha muitos amigos, entre eles elementos da família Laranjo e Canário.
Esta notável figura faleceu, depois de prolongada doença, em Castelo de Vide a 5 de Outubro de 1976. Contava pois apenas 66 anos de idade.
O Prémio Escolar Dr. Amável Soares da Silva foi instituído pela viúva, num gesto de sentida homenagem, aquando da morte do professor. Este Prémio tem os seus estatutos publicados em Diário da Republica e é em valor pecuniário, sendo que parte da verba tem de ser investida na aquisição de livros.
Como curiosidade refira-se que Amável Silva foi um destacado professor que sempre se norteou pela competência e também exigência, sendo ainda hoje recordado pela sua pose muito gentleman, no bom sentido do termo. Ao que nos informaram, em Lisboa chegou mesmo a ser Professor do actual Presidente da Republica Portuguesa, quando este frequentou Instituto Comercial de Lisboa.
Aqui fica pois registada, em jeito de Homenagem, um percurso da vida deste notável castelovidense que nasceu há 100 anos. Agradecemos a amabilidade das pessoas que nos forneceram informações sobre o Dr. Amável Silva, sendo certo que este se resume apenas a um singelo e despreocupado artigo que pensámos ser de todo o interesse registar aqui e agora.
Entretanto conseguimos apurar que o espólio literário e documental do Dr. Amável Soares da Silva vai reverter a favor do Município de Castelo de Vide e da sua Biblioteca Laranjo Coelho.
Notícias de Castelo de Vide (blog)

segunda-feira, 15 de agosto de 2016

NISA - GENTE DA MINHA TERRA - José Casimiro

“ Corri meio mundo pela música e pelo futebol”
José Casimiro da Piedade Bicho, nasceu em Nisa, há 77 anos.
Andou na Escola do Rossio, aprendeu as primeiras letras com o professor Camilo, pisou, descalço, os caminhos e azinhagas que o levavam à brincadeira e à aventura, quando não havia bola de trapos para pontapear. A rua era, na década de 30, o espaço natural de convívio, experiências e crescimento. Com o pai, aprendeu a arte de carpinteiro e tomou o gosto pela música. Uma paixão que durante a vida lhe garantiu uma parte do sustento, mas que teve que dividir com outra: o futebol. Em “Gente da Minha Terra”, José Casimiro, começa por nos lembrar alguns dos tempos da sua infância
“Nasci na rua Direita e frequentei a Escola Primária do Rossio, tendo como mestre o professor Camilo.
O jogo da bola era a nossa principal brincadeira. Jogávamos à bola nos Postigos, ao lado do Cinema, no largo da Escola, onde calhava e não implicassem connosco. As bolas eram as famosas “trapeiras”. Eu roubava meias velhas à minha mãe e enchíamos-las de trapos. Era assim naquele tempo, não havia dinheiro para o essencial, quanto mais para bolas.”
Paixão pelo futebol e pela... música
José Casimiro teve sempre a música como companheira de infância. O pai e a vizinhança não deixavam passar, um dia que fosse sem que os acordes musicais da trompete, do saxofone, do banjo ou da concertina alegrassem as ruas próximas da Praça do Município.
“Posso dizer que nasci num ambiente “musical” e este acabou por me influenciar e dar um rumo à minha vida. O meu pai era o homem dos sete instrumentos e tocava desde o saxofone ao banjo e acordeão.
O meu grande sonho era jogar à bola. Tinha jeito, jogava a avançado e marcava muitos golos, mas o meu pai teimava comigo pois queria que eu fosse músico. Ainda aprendi clarinete na banda de música com o mestre Franco, mas foi a tocar acordeão que me tornei conhecido e ganhei alguns tostões ainda na minha juventude. Foi o meu pai que me ensinou e ainda me lembro do primeiro serviço que fiz, com 13 ou 14 anos, o casamento do ti Laquim. Dois dias de festa, a tocar no acompanhamento e nos bailes.
Assim que acabei a instrução primária comecei a aprender a arte de carpinteiro e marceneiro com o meu pai. Aos sábados e domingos havia bola e bailes à noite.
Percorri o concelho de Nisa e outras terras vizinhas a tocar em bailaricos, casamentos, e acompanhamento dos rapazes que iam tirar “sortes”
No princípio dos anos 40 formou-se um clube popular, os Canários, e eu fui um dos fundadores. Não tínhamos sede nem nada, juntávamos-nos só para jogar futebol. Pagávamos uma quota simbólica, para podermos comprar uma bola e sempre que havia jogo, lá ia eu pedir umas pontas de sapateiro e uma sovela ao ti Augusto Calhabré para podermos dar uns pontos na bola se ela rebentasse.
Com 17 ou 18 anos comecei a jogar no Nisa e Benfica e posso dizer que tínhamos uma grande equipa. Naquela altura não havia provas oficiais nem as “camadas jovens”. Foi pena porque havia muita rapaziada com jeito e vontade de jogar futebol. Jogávamos em muitas terras do distrito, desde Arronches, Gáfete, Portalegre e tantas outras, e íamos a Espanha, a Valência de Alcântara, disputar um torneio nas festas de Verão. Uma das vezes em que ganhámos o torneio marquei dois golos.
No futebol e em competições oficiais joguei na Casa do Povo da Urra e fomos campeões regionais da FNAT, sendo eliminados pela Companhia dos Telefones (Lisboa) que era uma autêntica selecção de jogadores veteranos e que passaram pela 1ª Divisão nacional.
Eu gostava muito de futebol e chegava a vir de Lisboa, de propósito só para jogar.”
Como muitos jovens do seu tempo, José Casimiro teve de sair da sua terra e procurar novos horizontes para o futuro que começara a construir.
“Estive em Nisa a trabalhar até 1960, ano em que entrei para a Carris, como motorista.
Em Nisa, tinha o ofício de carpinteiro e tocava em bailes, festas e “sortes” por todo o distrito.
A par do futebol, acabei por agarrar a concertina com as duas mãos. O meu pai ensinou-me e durante a vida fui sempre um autodidacta. Na tropa, durante 29 meses, também aprendi muito, pois tinha uma grande facilidade em fazer a leitura musical.
A ida para Lisboa facilitou o contacto com outros músicos e com empresários do ramo.
Durante as décadas de 60, 70 e parte da de 80, fiz o acompanhamento musical de muitos artistas conhecidos, como Lenita Gentil, Fernanda Batista, Anita Guerreiro, Vitória Maria, Tristão da Silva Jr., Rosita Afonso, hoje mais conhecida como Rosa do Canto, Joaquim Cordeiro, Francisco Jorge e tantos outros.
Foi uma época de trabalho muito preenchida e esgotante, com espectáculos todos os fins-de-semana, na zona de Lisboa, no Ribatejo ou no Alto Alentejo. Posso dizer que, praticamente, actuei em todas as localidades do nosso distrito.
Em 1982, percorri todas as localidades do concelho de Loures e muitas outras do país, com a revista “ A Pata que os Pôs” com o José Viana, Dora Leal, Carlos Miguel, Lia Sena e outros actores.
Participei, a título gracioso, em muitos espectáculos de beneficência, tanto em Lisboa, como em Nisa e Vila Velha de Ródão, terra da minha esposa.”
Sinfonia na Rua Direita
A Rua Direita, onde nasceu José Casimiro, chegou a ser conhecida como a rua dos músicos, tal a quantidade (e qualidade) dos executantes que ali residiam e que a horas certas ou incertas faziam ouvir os seus instrumentos.
“É verdade. A Rua Direita, a certas horas, mais parecia uma orquestra sinfónica, tal a quantidade de músicos que se ouviam na rua a ensaiarem. No princípio da rua estava o ti Xirra. Em frente, a nossa casa e três músicos (o meu pai, eu e o meu irmão António que também tocava acordeão). Mais acima, o ti Abílio Porto, o ti Luís Félix e a família Calhabré, pai e filhos, onde ensaiava o grupo “Os Fixes”
Na casa do meu pai ensaiou durante algum tempo o grupo “Os Unidos”. Enfim, nesses tempos, Nisa tinha muitos e bons músicos, havia um grande gosto pela música, um gosto que felizmente não se perdeu.
Eu ainda fiz parte de um conjunto musical, “Alegria e Ritmo” que além de mim, integrava o meu irmão António (tocávamos os dois acordeão), Carlos Pequito (clarinete) Vítor Bonito (vocalista e bateria) e Manuel Filipe (vocalista e bateria).
Actuámos várias vezes em Portalegre, nos santos populares, no bairro junto ao campo da Fontedeira. Na altura, Portalegre tinha boas orquestras, como a “Ideal”, Ferrugem”, “Alentejanos”, mas nós conseguíamos atrair mais gente porque tínhamos um melhor repertório, principalmente de músicas espanholas que o meu pai arranjava.”
Aos 77 anos, com duas filhas e três netos, José Casimiro continua a adorar a sua terra, a ser presença nos convívios dos Zés, dos “artilheiros” e noutras festas populares, como a da romaria da Senhora da Graça, onde a sua concertina já faz parte da paisagem “musical”. Foi lá que o encontrámos e nos desfiou o seu registo de memórias.
“Venho a Nisa sempre que me convidam. Gosto de conviver com os meus amigos, lembrar a minha infância e juventude, os tempos que cá passei.
Era bom que voltassem a fazer umas festas como as Festas do Povo, em 1975 e 1976, nas quais colaborei com muito prazer, com actuações e ajudando a escolher muitos artistas.”
Mário Mendes in "Fonte Nova" - 3/5/2011

domingo, 7 de agosto de 2016

MEMÓRIA: Evocação de Diogo Pires Mimoso

DIOGO PIRES,..HONRA E GLÓRIA PARA NISA,... UM NISENSE BEATIFICADO SANTO E MÁRTIR, santificado seja para sempre o seu nome; da necessidade de celebrar e venerar a sua memória a 17 de Julho de cada ano.... "A oração. é o modo do ser humano franquear as fronteiras da sua humanidade para entrar, de algum modo no domínio do divino”, cfr frei Herculano Alves in "Bíblica", ano 57, Julho/Agosto, nº 335, pg. 26.)
A evangelização do Brasil levou os Jesuítas em 1570 a organizar um grupo de missionação e evangelização.
Compunham um grupo de 40 jesuítas (jovens entre 20 e 30 anos), 32 portugueses e oito espanhóis, destinados à missão, 2 eram sacerdotes, dois diáconos, 23 estudantes e catorze irmãos, sob a liderança do padre Inácio de Azevedo.
A preparação dos missionários, padres, irmãos e estudantes para a missão de evangelização realizou-se na Costa da Caparica (Portugal), na Quinta do Vale do Rosal., hoje Quinta dos Quarenta Mártires (...e porque não aproveitar a estada na Costa da Caparica para uma romagem de homenagem e veneração emocionante à memória deste santo mártir de Nisa ,e ajoelhar perante tanta luz profunda, mesmo sem entender).
Roçando a ilha da Madeira , a 12 de Junho de 1570, para consertar as embarcações, descansar e recolher mantimentos, seguiram na nau Santiago 39 companheiros com Inácio de Azevedo.
Ao cabo de alguns dias de viagem, era o dia 15 de Julho de 1570, faz agora precisamente 441 anos, “davam já a volta para a cidade da Palma, de que distavam duas ou três léguas”.
A pouca distância de Tazacorte ( La Palma) avistaram a vela de uma grande nau e depois mais três, de modo que, inicialmente, chegaram a pensar tratar-se da armada de D. Luís de Vasconcellos, mas tal não se veio a confirmar.
Foram surpreendidos por um navio francês comandado pelo calvinista Jacques Sourie.
Os calvinistas abordaram a nau com enorme alarido, praguejando e ameaçando de morte os missionários.
Como referido tratava-se de Jacques de Sória, corsário calvinista francês, conhecido pelo seu ódio de morte aos católicos e entre estes, muito especialmente, aos jesuítas.
Acompanhavam Sória perto de meio milhar de soldados, todos eles animados pelo mesmo furor contra a igreja e fé católicas.
Seguiu-se grande carnificina e ordens para lançar ao mar os sagrados mártires.
Cumpre pois divulgar a vida e história desses mártires, e nomeadamente do nisense Diogo Pires, convidando-se os jovens das áreas científicas competentes a embrenharem-se na respectiva investigação histórica e correlatas, elegendo em concreto a história do percurso pessoal deste jovem e projectando a imagem do santo mártir.
Beatificados pelo Papa Pio XI, em 11 de Maio de 1854, as actividades desenvolvidas na causa da canonização não deixarão de trazer grande contributo a trabalho rigoroso sobre o nosso santo conterrâneo, sujeito a tão grande martírio.
A festa litúrgica destes mártires é celebrada em 17 de Julho , como acima.
Honra e glória pois para Nisa ao ter no seu universo e seio espiritual ,moral ,social e ,religioso, quem tão generosamente partira para afinal tão grande martírio, mas para lograr chegar ainda jovem...tão alto ...à glória dos altares, patamar que acolhe e confirma a aquisição do glorioso e definitivo título de Filho de Deus.
Santificado seja pois para sempre o seu nome.
Todos foram ali mortos e feridos, à excepção do irmão João Sanches, que os calvinistas aproveitaram para cozinheiro.
Todos foram lançados ao mar, uns já mortos, outros em agonia e outros ainda vivos.


Lista dos mártires:1. Inácio de Azevedo, padre português e líder da missão (n. Porto, Portugal),2. Diogo de Andrade, padre, (n. Pedrógão Grande, Portugal),3. Bento de Castro, irmão, estudante (n. Chacim, Macedo de Cavaleiros, Portugal),4. António Soares, irmão, estudante (n. Trancoso da Beira, Portugal),5. Manuel Álvares, irmão, coadjutor (n. Estremoz, Portugal),6. Francisco Álvares, irmão, coadjutor (n. Covilhã, Portugal),7. Domingos Fernandes , irmão, estudante (n. Borba, Portugal),8. João Fernandes, irmão, estudante (n. Braga, Portugal).9. João Fernandes, irmão, estudante (n. Lisboa, Portugal),10. António Correia, irmão, estudante (n. Porto, Portugal),11. Francisco de Magalhães, irmão, estudante (n. Alcácer do Sal, Portugal),12. Marcos Caldeira, irmão, (n. Vila da Feira, Portugal),13. Amaro Vaz, irmão, coadjutor (n. Benviver, Marco de Canavezes, Portugal),14. Juan de Mayorga, irmão, coadjutor (n. Saint-Jean-Pied-de-Port, Navarra, hoje França),15. Alonso de Baena, irmão, coadjutor (n. Villatobas, Toledo, Espanha),16. Esteban de Zuraire, irmão, coadjutor (n. Amescoa, Biscaia, Espanha),17. Juan de San Martín, irmão, estudante (n. Yuncos, Toledo, Espanha),18. Juan de Zafra, irmão, coadjutor (n. Jerez de Badajoz, Espanha),19. Francisco Pérez Godói, irmão, estudante (n. Torrijos, Toledo, Espanha),20. Gregório Escribano, irmão, coadjutor (n. Viguera, Logroño, Espanha),21. Fernán Sanchez, irmão, estudante (n.Castela a Velha, Espanha),22. Gonçalo Henriques, irmão, estudante (n. Porto, Portugal),23. Álvaro Mendes Borralho, irmão, estudante (N. Elvas, Portugal),24. Pero Nunes, irmão, estudante (n. Fronteira, Portugal),25. Manuel Rodrigues, irmão, estudante (n. Alcochete, Portugal),26. Nicolau Diniz, irmão, estudante (n. Bragança, Portugal),27. Luís Correia, irmão, estudante (n. Évora, Portugal),28. Diogo Pires (Mimoso), irmão, estudante (n. Nisa, Portugal),29. Aleixo Delgado, irmão, estudante (n. Elvas, Portugal),30. Brás Ribeiro, irmão, coadjutor (n. Braga, Portugal),31. Luís Rodrigues, irmão, estudante (n. Évora, Portugal),32. André Gonçalves, irmão, estudante (n. Viana do Alentejo, Portugal),33. Gaspar Álvares, irmão, estudante (n. Porto, Portugal),34. Manuel Fernandes, irmão, estudante (n. Celorico da Beira, Portugal),35. Manuel Pacheco, irmão, estudante (n. Ceuta, Espanha),36. Pedro Fontoura, irmão, coadjutor (n. Chaves, Portugal),37. António Fernandes, irmão, coadjutor (n. Montemor-o-Novo, Portugal),38. Simão da Costa, irmão, coadjutor (n. Porto, Portugal),39. Simão Lopes, irmão, estudante (n. Ourém, Portugal),40. João Adaucto, acompanhante (n. Entre Douro e Minho, Portugal),Não possui Nisa infelizmente qualquer imagem deste santo mártir.
Refere-se-lhe respeitosamente um nosso ilustre e piedoso conterrâneo, e santo pároco ,que o foi da Costa da Caparica , Padre Baltasar Dinis, tido por aquela comunidade como saudoso pároco, em carta escrita em
25 de Julho de 1939 ,um nome também a fixar desse rico universo cultural e espiritual e moral de Nisa.
Não tenho dados para por ex. bordar a ouro o retrato de D. Ana uma vez que pouco privei pessoalmente com a Senhora ( embora a adorasse), mas sei que num encontro de viúvas minha mãe, a minha querida, no seu sentido de justiça que lhe era peculiar, ao cumprimentá-la nesse encontro, lhe terá dito...não sou nada comparando-me com a senhora... a senhora é da Acção Católica, mas da Autêntica,.. da Verdadeira, e a D. Ana ( Machado ) na sua simpática e serena simplicidade ter-lhe-à dito...D. Maria Augusta não é bem assim,..... abraçaram-se e choraram naquela solene reunião).
E ainda há quem pense que não?
Não digas não, diz sim...porque estamos em Nisa (e a Nisa ...”eu iria arrancar estrelas/ delas fazia um colar/ para te por ao pescoço...Se num perfeito segundo/ o sol fosse apenas meu/ eu dava-Te o sol também/ arrefeceria o mundo /mas o sol seria Teu/ Teu e de mais ninguém. “ in Omnipotência, Manuel de Almeida , Fado) e Alto Alentejo, terra sagrada.
João Castanho - 11 de dezembro de 2013

Grupo musical nisense “rompe” com inactividade

Tributo aos UHF querem soltar "os cavalos de corrida"
O grupo musical nisense "Tributo aos UHF" quer voltar aos palcos, após um período de inactividade, devido a falta de espaço para ensaios, um problema que por ora parece resolvido, ainda que a título provisório.
Contrariamente ao que chegou a ser propalado, a banda não acabou e está de volta para prosseguir as actuações, quer no concelho, quer noutras regiões do país para onde seja convidada.
Joaquim Galhardo, baterista dos "Tributo aos UHF", que obteve um feito assinalável, em Maio do ano passado, tocando bateria durante 24 horas, revela-nos que "estamos de volta e com as malas feitas, prontos a recomeçar a nossa actividade musical, que foi interrompida por falta de um espaço adequado para ensaios."
Galhardo garante que "vamos começar o nosso trabalho brevemente, tivemos que improvisar um espaço em casa de um dos elementos da banda, um pouco acanhado, mas vamos ultrapassar esta situação, com muita vontade de mostrar que estamos cá e queremos continuar as nossas actuações, prestigiando a nossa terra e o grupo a que fazemos referência".
Para já, os "Tributo aos UHF" têm em mãos alguns contactos para possíveis actuações, não tendo sido convidados para actuar na Nisartes. A grande aposta, contudo, está na preparação e fortalecimento da banda, com vista ao desempenho no próximo ano.
" As actuações que fizemos e o entusiasmo que gerámos à nossa volta, dão-nos força para acreditar que este projecto tem "pernas para andar" e substância para se desenvolver. É preciso é que as instituições e pessoas do concelho acreditem em nós e nos dêem a oportunidade de mostrarmos o nosso valor".
Notícia publicada em 28/7/2009

quarta-feira, 3 de agosto de 2016

NISA: A Festa de Santo Isidro em 1959

Em memória de Ilídio Nogueira Leitão
O Santo Isidro era o padroeiro dos lavradores e em Nisa era prestada uma grande festa anual, em Maio, na Senhora da Graça.
Para o cabecinho, em coloridas e enfeitadas carroças de flores, erva, urze, giestas, seguiam os romeiros e devotos agradecendo as preces pela boas searas, a harmonia do tempo, a perspectiva do celeiro cheio e sem prejuízos.
Há 50 anos, a 24 de Maio de de 1959, foi realizado um Concurso de Quadras, assinalando a Festa de Santo Isidro e tendo como temas a Lavoura, as Actividades Agrícolas, as Alfaias e os Instrumentos de Trabalho. Subtemas que não se esgotavam e que iriam até à imaginação de cada um dos romeiros.
As quadras que aqui deixamos como registo foram da autoria de Ilídio Nogueira Leitão e obtiveram o 1º prémio na categoria A.
Ilídio Nogueira Leitão, nasceu em Nisa, em 1924 e viria a falecer em Paris, no popular Bairro de Saint Dennis, nos anos 90 do século passado.
A poesia popular que nesta espaço lhe dedicamos são também uma forma de recordar, enaltecer, o homem, o amigo e o nizorro, alegre e bem disposto que nunca deixou de ser, mesmo no auge da vida.
I
É dia de procissão,
Santo Isidro o protector.
É dia de grande festa,
A festa do Lavrador.
II
É terra de lavradores,
Criada por D. Dinis.
É decerto a mais fecunda
Porque Deus assim o quis.
III
Santo Isidro meu protector,
Meu santinho padroeiro.
Ajuda a minha seara,
De que sou o seu obreiro.
IV
Nossa Senhora da Graça,
Santo Isidro vai visitar.
Há festa no cabecinho,
Muitas graças lhe vou dar.
V
Já rompeu a madrugada,
Minha terra vou lavrar.
P´ra nascer a loira espiga,
Que no v´rão hei-de ceifar.
VI
Há canções de alegria,
Há a labuta no prado.
É a ceifeira quem canta,
A orquestra, é o arado.
VII
Há no prado verdejante,
Uma poesia d´amor.
O trabalho, a honra, a vida,
A Louvar Nosso Senhor.
VIII
Saúda, respeita e ama
O bondoso lavrador.
É o pão da tua boca
A lenha do teu calor.
IX
Minha mãe é lavradeira,
O meu pai é lavrador.
A minha mãe é ceifeira
E eu sou o lenhador.
X
A ceifar ganhei a vida,
A lavrar me vi crescer.
Enamorei-me da terra
E nela me vi morrer.

Os 25 Anos da Reactivação da Banda de Nisa

Sede própria é fundamental para encarar o futuro
Para comemorar os 25 Anos do Ressurgimento da Banda de Nisa, acontecimento que teve lugar em Outubro de 1982, a Sociedade Musical Nisense, promoveu um conjunto de iniciativas de carácter musical e cultural, evocando 25 anos de actividade e também a criação da própria colectividade, fundada em 1988, na esteira e preservação do património da antiga Sociedade Phylarmonica Nizense, fundada no distante ano de 1844.Assim, no dia 29 de Setembro, decorreu em Nisa, um encontro de bandas, com a participação da banda anfitriã (Sociedade Musical Nisense) e as convidadas Sociedade Filarmónica do Crato e Banda Musical Alterense, uma iniciativa de grande brilhantismo e que trouxe animação e colorido às ruas da vila e ao seu largo principal, a Praça da República, onde teve lugar o concerto final que juntou as três bandas.
Estava dado o mote para as comemorações dos 25 anos do ressurgimento da Banda de Nisa, por ocasião da Feira de S. Miguel, em 1982, no Cine Teatro, com a primeira apresentação pública da “nova” banda que incluiu muitas crianças e jovens, formadas a partir do início desse ano e a que se juntaram músicos mais velhos e experientes, vindos de outras formações da Banda Municipal de Nisa.
O ressurgimento da banda em 1982, após um período, de certo modo longo, de inactividade, culminou um trabalho desencadeado anos antes e que contou com o apoio da Câmara Municipal de Nisa, presidida pelo dr. Carlos Bento Correia e tendo como vereador do pelouro da Cultura, o dr. José Manuel Basso.
A abertura de concurso externo como canalizador dos Serviços Municipalizados, do músico nisense António Maria Charrinho, a residir na Grande Lisboa, possibilitou a criação de uma escola de música, com a regência a cargo deste mestre, primeiro nas instalações da Sociedade Artística Nisense, colectividade a que nos primeiros tempos, a Banda esteve agregada e mais tarde num espaço cedido nas instalações do Cine Teatro de Nisa, que tem funcionado também como a sede provisória da SMN. Pelo meio, a renovada Banda de Nisa ainda utilizou para ensaios e para a guarda de material, o espaço da JAC (Juventude Agrária Católica) na capela de S. Francisco, anexa à Igreja Matriz e uma casa particular, na Urbanização da Fonte Nova.
Os 25 anos do ressurgimento da Banda de Nisa são, também, a história de uma associação que tem andado “com a casa ás costas”, ensaiando e programando actividades em espaços acanhados e sem um mínimo de condições, obstáculos que só com a boa vontade dos seus dirigentes e principalmente dos seus músicos têm sido ultrapassados.
Natural, pois, que os discursos na sessão solene realizada no passado sábado, no Cine Teatro de Nisa, antes da apresentação de um CD gravado pelos actuais grupos da Sociedade Musical Nisense (Banda, Orquestra Ligeira e Filarmonisa) tivessem incidido no desejo de realização do sonho maior que comanda a vida desta associação: a construção de uma sede social, com condições que permitam quer o crescimento da colectividade, quer, sobretudo, uma maior qualidade e afirmação no trabalho que vêm desenvolvendo na promoção da música e da cultura do concelho.
Na mesa da sessão estiveram o Governador Civil, Jaime Estorninho, a presidente da Câmara de Nisa, Gabriela Tsukamoto, o anterior e actual presidente da direcção da SMN, José Hilário e João Maia, respectivamente.
Todos foram unânimes em reconhecer, por um lado, o papel insubstituível das bandas filarmónicas e das colectividades que lhes dão vida, na educação musical de crianças, jovens e adultos e na ocupação dos tempos livres, para além da importância atribuída às bandas como detentoras de um vasto património cultural e na animação das festividades locais, aos mais diversos níveis.
Gabriela Tsukamoto prometeu empenhar-se na concretização do grande objectivo da Sociedade Musical Nisense, a construção da sede social, na Urbanização das Amoreiras e para a qual a associação dispõe de projecto já aprovado.
Com a sala do Cine Teatro de Nisa bem composta, a sessão prosseguiu tendo sido feita uma retrospectiva da vida da SMN nestes últimos 25 anos e presenteados os músicos que encetaram a caminhada em 1982 e que ainda integram os diversos agrupamentos musicais da associação.
Seguiu-se a apresentação pública do CD gravado em Agosto, durante três dias, no Cine Teatro, tendo para o efeito actuado a Banda, a Orquestra Ligeira, e grupo de metais, Filarmonisa.
Mais tarde, na Igreja Matriz foi celebrada uma missa por intenção dos antigos músicos e dirigentes já falecidos.
Um jantar convívio que juntou cerca de 200 pessoas no salão de festas do Sport Nisa e Benfica encerrou a festa evocativa da reactivação da Banda de Nisa há 25 anos, período de actividade bem documentado numa exposição que pode ser vista no átrio do Cine Teatro.
Mário Mendes - in "Jornal de Nisa" -Nº 241- 17/10/2007

NISA: Record nacional a tocar bateria

Joaquim Galhardo cumpriu sonho antigo.
Joaquim Galhardo tinha um sonho, antigo, que acabou de transformar em realidade, a toque de bateria. Entre as 15 horas de sábado e as 15 horas de domingo, deu um autêntico festival de bateria e de resistência, ao tocar durante 24 horas no palco do Cine Teatro de Nisa, ultrapassando em oito (8) horas o anterior máximo português registado com 16 horas.
A iniciativa integrava o programa de comemorações dos 10 anos da Inijovem e a prestação do jovem baterista nisense, a todos os títulos excepcional, transmitiu à festa da Inijovem uma maior alegria e brilhantismo.
Joaquim Fernando Temudo Granchinho Galhardo tem 30 anos e trabalha na administração local. Desde os 14 anos que se entrega a um dos seus maiores prazeres, quando conseguiu, através de poupanças, comprar a primeira bateria. Um gosto e um jeito que lhe vem de pequenino, dos tempos em que qualquer lata de tinta ou caixa de cartão, lhe serviam para improvisar batidas e sons.O apelo da música era constante e sem surpresa viu-se a aprender solfejo na Escola da Banda de Nisa. Mas foi sol de pouca dura, pois o que queria mesmo era tocar, tocar bateria, instrumento a que na Banda não podia chegar por não ser ainda instrumentista.Em casa, sempre que podia e os ouvidos dos familiares e vizinhos suportavam, ia fazendo aquilo que mais gostava e a entrada para o primeiro conjunto musical, o Nova Estrela, deu-se com apenas 15 anos. Ligou-se ao Feed Back, ajudando na instalação de material, nos bailes e concertos, tudo para estar próximo do seu instrumento de culto, a bateria. O grupo Fogo Posto foi o passo seguinte e tocaram algumas vezes no celeiro da EPAC, para desconforto da vizinhança, “que protestava sempre por causa do barulho”, antes de chegar aos Xaga, grupo a que empresta o seu vigor e determinação como baterista, desde 2005.
As actuações em bailes e a animação de bares têm servido para Joaquim Galhardo ir testando as suas capacidades físicas e psicológicas, antes de se lançar numa aventura e projecto maior: tocar bateria durante mais de 16 horas consecutivas. É este o record português e o músico nisense traçou como objectivo chegar às 24 horas a tocar, consecutivamente. A grande prova, passou-a, com distinção, no passado fim-de-semana, no palco no Cine Teatro de Nisa. Apoiado por muitos amigos, músicos e pelas pessoas que durante as 24 horas foram passando pela sala de espectáculos, dirigindo-lhe palavras de apoio e incitamento, o Joaquim Galhardo concluiu a “Maratona de Bateria”, num final apoteótico, com o público de pé, a tributar-lhe uma impressionante ovação que se prolongou durante vários minutos.Cansado e comovido, o novo recordista nacional, a tocar bateria, a todos agradeceu. Para trás ficavam 24 horas de batidas e os ritmos musicais, de todos os tipos, com que os amigos contribuíram para dar asas ao sonho. Foi uma prova de grande resistência, física e psicológica que o Joaquim ultrapassou com galhardia.Num curto espaço de tempo, Nisa ganhou um campeão nacional de corta-mato e passou a ter um recordista nacional a tocar bateria.
Digam lá, agora, que os alentejanos é que são lentos...
Mário Mendes – 28/5/2007

segunda-feira, 1 de agosto de 2016

MEMÓRIA(S) DE NISA: As Sortes

Há muita variação de “sortes”, mas aquela a que me refiro, não é a parcela de terreno que herdámos dos nossos pais., ou aquelas que possuímos após termos ganho na lotaria. Falo das “sortes”, desse acto em que todos os jovens noutros tempos eram obrigados a participar: a chamada “inspecção militar”.
As sortes realizavam-se todos os anos, na sede do concelho, feita por meia dúzia de oficiais do Exército, que já nessa altura e para impressionar, nos falavam asperamente, ao bom estilo da filosofia da tropa.
Ainda me lembro bem, foi num dia de Verão, em que parte da rapaziada descobriu o seu corpo pela primeira vez, admirando ou gesticulando este ou aquele que possuíam marcas de  nascença.
Os nossos pais e noivas aguardavam-nos, silenciosos, no Largo do Município, para nos felicitarem ou chorarem a nossa “sorte”. Havia a guerra do Ultramar e a fita vermelha na lapela do casado significava “Apurado” para todo o serviço militar e depois, geralmente, a mobilização para as colónias.
Quase todos ficavam “apurados” nesse tempo. Os nossos pais, à guisa de consolação, diziam-nos: “deixa lá, filho, a tropa fará de ti um homem!”.
Alguns, poucos, saíam de fita branca. Ficavam “livres” do serviço militar. Outros, ainda, com a fita verde, ficavam a aguardar, de “espera”, ou por nova inspecção ou que a situação se resolvesse.
As “sortes” eram, apesar de tudo, uma festa. A Nisa chegava a rapaziada de todo o concelho, em grupos, com um tocador de concertina à frente, seguido da malta com fitas garridas e pandeiretas. Percorriam as ruas da vila, entravam nas tabernas, cantavam e dançavam com uma tal alegria que não adivinhava as horas de incerteza, de perigo e de sofrimento que a muitos aguardava.
A rapaziada de Montalvão, todos de lenço ao pescoço, uniram-se a nós, talvez por serem os mais amigos e juntos fizemos o percurso habitual dando vivas e gritos de contentamento, próprios da juventude.
À noite era o “Baile das Sortes” e a primeira dança era reservada apenas aos “sorteados”. O palco deste acontecimento era a sala ou o quintal do “Benfica”, sempre cheio e a transbordar de gente. Para alguns começava, nessa noite, a sua vida sentimental e aguardavam ali o “Sim ou o “Não” do seu bem-amado, pois havia o uso e o costume de as raparigas começarem a namorar a partir desse dia.
Hoje tudo parece ter mudado e já não se vê a concertina a tocar pelas ruas e a rapaziada também já não vão à tropa. Os nossos pais, esses, deixaram de chorar a nossa “sorte”, a par das raparigas, que agora são elas a pedir namoro aos rapazes.
Recordações de um tempo, de mocidade e em que a juventude dava largas à sua alegria.
António Conicha – Cantinho do Emigrante – Jornal de Nisa – nº 30 – 31 Março de 1999

MEMÓRIA: Vultos da História Nisense (1)

Álvaro Semedo e a projecção internacional do seu papel na História
Não pouco literatos, bibliógrafos e bibliófilos, apaixonados pela História, conhecem o nome de Álvaro Semedo, no todo do seu exemplo e da sua obra. Porém, nunca será demasiado relembrá-lo sugestivamente aos que o leram e ensiná-los ou ajudá-los a fixar àqueles que, por mercê de constantes e inúmeros afazeres quotidianos, não possam dedicar-se à benéfica e curiosa interpretação da sua eminente figura de alentejano.
Ela emerge da planura morna e projecta-se gigantescamente para além dos confins dos povos... Aí se forma e avoluma, antes que o significado indelével do seu exemplo seja laureado e conhecido pela Europa inteira.
A sua obra de homem de Letras é imperecível e ímpar na originalidade; o seu proceder e conduta de ministro de Deus e da Igreja é dignificante e sublime, num símbolo raro de dedicação à humanidade.
Álvaro Semedo nascera em Nisa, no decorrer do ano de 1585. Filho de Fernão Gomes e Leonor Vaz, ambos descendentes de famílias abastadas desta vila, cedo o seu espírito acordou para as Letras, começando, ainda adolescente, a dedicar-se à leitura e investigação de alfarrábios e manuscritos. Resolvera, depois, professar na Companhia de Jesus. Inscrevera-se no Colégio de Évora, a 30 de Abril de 1602. Distinguindo-se, mais tarde, como óptimo aluno de filosofia e humanidades, merecera a simpatia e a amizade pessoal do reitor, o qual, cedendo aos seus rogos, o deixara partir com alguns missionários que se dirigiam ao Oriente.
Chegado à Índia, matriculou-se no Colégio da Ordem, onde se ordenou sacerdote. Pouco depois, penetrava na China e aí começou a desenvolver toda a sua obra no sentido da propagação da Fé e, ao mesmo tempo, na concepção de fazer chegar aos povos distantes da civilizada Europa, a história, os costumes de tão remotas e ignotas gentes.
Para isso, entabulou conhecimentos e tratou piedosamente com o gentio, no fim único de o imiscuir adentro da civilização e do cristianismo, suportando torturas sem nome na revolta de Nanquim (1617) e sendo escorraçado para Macau. Todavia, a China misteriosa e o negrume da sua história quase legendária eram o seu sonho e a sua vida. Regressando à cidade de Nanquim e voltando aos deveres de missionário, empreendeu uma série de estudos sobre a monarquia chinesa. Daí proveio o célebre livro de sua autoria Relação da Grande Monarquia da China com edição esgotada e muito raro. (1)
Foi traduzido para o espanhol por Manuel de Faria e Sousa, com o título de Império de la China y cultura evangélica en el por los religiosos de la Companhia de Jesus, sacado de las noticias del padre Álvaro Semedo; para italiano, por Hermano Scheus (1643); para francês por Luís Cullon (1655), e ainda para inglês. Porém, a sua obra literária não compreende apenas esta, de renome internacional.
Existe outro seu volume – Cartas Anuais – aonde o autor relata, em primoroso estilo epistolar, o evoluir progressivo das Missões na China e alguns factos com elas relacionados. Publicaram-se ainda, também de sua autoria, dois dicionários incompletos – Dicionário Sínico Lusitano e Lusitano Sínico – porquanto a morte o surpreendeu, antes de devidamente coligidos e completados.
No apogeu de carreira brilhante, foi Álvaro Semedo chamado a Portugal pela Companhia de Jesus que o nomeou procurador a Roma. Desempenhando-se digna e sapientemente da sua missão era, mais tarde, nomeado provincial e visitador das Missões na China.
Aí morreu aos 6 de Maio do ano de 1658. (2)
Carlos Franco Figueiredo in Revista Alentejana –nº 270 – Out. 1959
NOTAS
(1) - ...O manuscrito de Álvaro Semedo, concluído em 1637, conheceu a primeira edição em castelhano (1642), várias edições em italiano (1643, 1653, 1667 e 1678) em inglês (1655), em francês (1645, 1667) e em holandês (1670). Provavelmente existirão edições noutras línguas. Em português, só em 1956, e por iniciativa de Luis Gonzaga Gomes. Porém, em 1731, dera ao prelo, em jeito de descargo de consciência, uma edição sintética da obra da responsabilidade de Manoel de Faria e Sousa. Registe-se aquilo que os ingleses sublinham logo após o título da obra de Semedo: «História da Grande e Reputada Monarquia da China... escrita em italiano por F. Alvarez Semedo, um português.... traduzida agora para inglês, por pessoa competente,.... com o objectivo de satisfazer os curiosos e engrandecer o comércio da Grã Bretanha». Sempre presente, o conhecido pragmatismo britânico.
Joaquim Magalhães de Castro in "O Clarim" - 27/6/08
(2) - A Câmara Municipal de Nisa, na reunião de 7 de Junho de 2006 aprovou por unanimidade a atribuição do nome do Padre Álvaro Semedo à (ainda) actual Zona F do Bairro da Cevadeira.
Tarda a perpetuar com a honra e o brio que merece, o nome de Álvaro Semedo na toponímia de Nisa. Para que não restem dúvidas transcrevemos a parte da acta referente ao ilustre nisense:
Acta 12 – Reunião de 7 de Junho de 2006
Relativamente ao assunto a que acima se faz referência, tendo em conta o número de novas edificações erigidas, bem como a criação de algumas urbanizações, tanto em Nisa como um pouco por todo o concelho e tendo-se a consciência que é necessário disciplinar a toponímia e conforme conteúdo da Informação/ Proposta Nº 145/06, datada do dia 8 de Março do ano em urso, da Divisão de Projectos e Urbanismo, cuja cópia fica arquivada em pasta anexa à presente acta, a Câmara reunida aprova, por unanimidade e após pareceres das respectivas Juntas de Freguesia, a atribuição de nomes e numeração de polícia às ruas, largos, praças e urbanizações das localidades a seguir indicadas:
(...) Na Urbanização da Cevadeira (...) à actual Zona F, será atribuído o nome de “Rua Padre Álvaro Semedo”.
Seis anos passados esta deliberação e muitas outras referentes a nomes de ruas estão por cumprir. Até quando?
Mário Mendes (1 Dez. 2012)