Quando
a memória projecta a mudança
Há
uma farmácia, na Porta da Vila, em Nisa, com uma história de mais de um século
para contar. Por ela passaram vários farmacêuticos e nela se fixou durante uma
vida, Aniceto Ferreira Pinto, uma das figuras incontornáveis de Nisa do século
passado.
O
largo, nessa altura, enchia-se de gente e pululavam os estabelecimentos
comerciais. Na farmácia, espaço cultural e local de encontro da gente grada da
terra, discutiam-se as notícias ouvidas na rádio ou lidas no jornal do dia
anterior.
Os
dias passavam pachorrentos e iguais e quaisquer ideias de mudança eram
prontamente abafadas. Não se estranha, por isso, que tal como o torpor das
horas e dos dias, o interior da farmácia se mantivesse inalterável durante anos
e anos. Os fregueses sendo muitos, consumiam pouco, o indispensável, que o
dinheiro não dava para comer quanto mais para o “luxo” dos medicamentos. Em
caso de sintomas de doença, valiam-se das “mezinhas caseiras, algumas delas (os
preparados) eram feitas no “laboratório” (nome pomposo para aquele tempo) da
farmácia.
Nasciam
assim as “papas de linhaça”, de óleo de fígado de bacalhau e tantas outras que,
em caso de aflição iam resolvendo alguns problemas.
Hoje
as exigências são muito mais sérias e o conceito de farmácia sofreu uma
transformação radical, abrindo-se a novos serviços e públicos.
A
exiguidade e antiguidade do espaço, as limitações impostas e a falta de uma
alternativa para a expansão do estabelecimento levaram Maria Alexandra Otto
Pinto, neta do Dr. Aniceto, a adquirir um edifício ao lado da antiga loja, no
qual, após as obras de transformação, nasceu, esta semana, a nova Farmácia
Ferreira Pinto, conforme a própria nos deu conta.
“Adquiri
o edifício, que foi todo recuperado mantendo a traça original, tendo a farmácia
sido instalada no rés-do-chão.
“ O
que pretendemos, acima de tudo, é ter aqui no centro histórico, uma farmácia de
proximidade e que proporcione aos seus utentes uma vasta gama de serviços de
qualidade.”
No
rés-do-chão fica a farmácia, o chamado espaço comercial de atendimento e ao
lado o designado Gabinete do Utente.
“É
um espaço mais reservado, próprio para termos uma conversa mais intimista com
os utentes e funciona também como o local de medições do colesterol, tensão
arterial e outros.”
Segue-se
noutro compartimento, o Laboratório onde se faz a preparação dos manipulados,
sendo o primeiro andar destinado a armazéns.
Sobre
os motivos que levaram a estas transformações, a directora técnica da Farmácia
Ferreira Pinto, adianta que “foi a necessidade de criar melhores condições não
apenas para os que aqui trabalham, mas, acima de tudo, para os nossos utentes,
que passam a dispor um espaço mais amplo e agradável".
Dispomos
agora de quatro postos de atendimento, sendo a equipa formada por cinco
profissionais, dos quais três farmacêuticos, um técnico de farmácia e um
auxiliar.”
No
que respeita à concorrência que as farmácias vêm enfrentando com a venda de
medicamentos nas grande superfícies comerciais, Maria Alexandra sente-se
optimista, até porque, como “somos sócios da Apifarma, foi criado um Cartão das
Farmácias que permite ao utente ir acumulando pontos que podem reverter a favor
da compra de novos produtos, com uma poupança significativa".
"Para
além disso, fazemos três rastreios diferentes (medição da glicemia, colesterol,
ácido úrico), rastreios que pretendemos realizar em algumas instituições das
freguesias, como aquele que foi feito, recentemente, no Pé da Serra.”
“Às
vezes - garante – “é preciso haver concorrência para nos estimular a
enfrentarmos novos desafios e a sermos mais criativos e dinâmicos.
A
aposta das novas instalações vai ser essa, a de uma relação mais estreita e
privilegiada com os utentes e na prestação de serviços de qualidade.”
Maria
Alexandra Otto Pinto Marçal é uma jovem cheia de ideias e de vida.
Licenciada
em Farmácia pela Universidade de Coimbra, veio para Nisa logo após completar o
curso para retomar e dirigir o “negócio” da família.
A
Farmácia Ferreira Pinto, desenvolvida com pulso e tenacidade pelo avô (Dr.
Aniceto), esperava-a no velho edifício da Porta da Vila.
“Desde
pequenina que dizia que ia seguir farmácia. Sempre gostei muito de arrumar os
medicamentos, do “cheiro da farmácia” e curiosamente, era a única neta em que o
meu avô não acreditava que pudesse seguir-lhe os passos.”
Mas
seguiu e há 10 anos que dirige o estabelecimento, nos primeiros tempos com a
preciosa ajuda de Adelino Toucinho, um ajudante de farmácia com muita tarimba e
companheiro inseparável do Dr. Aniceto.
Após
dez anos no estabelecimento legado pelo avô, Maria Alexandra achou que chegara
a hora de procurar instalações mais confortáveis.
Fez
obras num edifício contíguo, investiu e a “nova” Farmácia Ferreira Pinto surgiu
agora com sinais de modernidade, mas projectando na mudança, a memória do seu
principal obreiro: Aniceto Ferreira Pinto, o avô.
Mário
Mendes in "Jornal de Nisa" - nº 265 - 22/10/2008