terça-feira, 8 de março de 2016

O Natal visto por poetas nisenses (1)


O Mendigo
(Natal é quando um homem quiser - Ary dos Santos)
Estendendo a rôxa mão à caridade,
Lá vai de porta em porta o bom velhinho,
Cabelos cor de neve do caminho,
E nostálgicos olhos de saudade!

Também teve o ardor da mocidade,
Um braço forte no labor do ancinho,
Mas os anos passando, de mansinho,
Quebraram o vigor da tenra idade!

E o homem, que viveu a luta insana
Da vida, tem a paga desumana,
Contida no dizer de uma oração!...

Soldado ignoto, morrerá um dia...
E o mundo ficará sem a arrelia
De repartir migalhas do seu pão!
- José Gomes Correia

Natal de Hoje
Da velha enegrecida chaminé de ontem
não chovem prendas.
De lá também Jesus, seu pai ou sua mãe
não espargem prendas,
pois nunca se soube, de entre a tríade,
qual foi o que algum dia
tenha derramado prendas.

Prendas? Hoje, Ontem e sempre?
A donde?

São prendas a miséria, a sede, a fome, a morte
que grassam por toda a parte
ou pelas três quartas partes do mundo?

Dadas, espargidas, derramadas?
As prendas só podem ser dadas
- dadas com o doce calor da verdade,
da pura entrega e do sentir profundo.

Dadas? Por aqueles que hora a hora
só tecem cruzes no peito,
bajulando a todo o instante
os ricos mais que os pobres;
a tríade que parece não saber pesar, medir, palpar,
a imensíssima diferença que existe
entre tudo aquilo que é excesso
e tudo o resto – três quartas partes do mundo –
que é defeito e que persiste?
António Bento (7/12/2002)