Grande
manifestação de religiosidade
A
população de Nisa saiu à rua na tarde do domingo (dia 2) para acompanhar o
Senhor dos Passos naquela que é, nesta vila e desde há séculos, uma das mais
impressionantes manifestações de fé: a Procissão dos Passos.
Num
dia de sol, as flores e as cores de cada Passo sobressaíram na sua luminosa
simplicidade. De simplicidade e de apelo à reflexão, à compaixão e amor ao
próximo falaram as mensagens em cada paragem ou estância.
Foi
assim desde o início da procissão, na Igreja Matriz, com muito povo a
acompanhá-la, e a banda de música da Sociedade Musical Nisense, a fazer-se
ouvir nas suas marchas fúnebres condizentes com a solenidade do evento.
O
cortejo religioso desceu a rua Direita, a antiga rua da Cadeia e voltou pela
rua Dr. Graça à porta de entrada da antiga vila. Paro por aqui. Vou viajar no
tempo e dar a palavra ao professor José Francisco Figueiredo.
Vamos
supor que ele assistiu, no passado domingo, à Procissão dos Passos na vila onde
ambos nascemos...
“Muito
antes da hora marcada para a Procissão começa a fluir ao Calvário o pulcro
(lindo, belo) e numeroso bando de anjos e, regorgita de irrequietos querubins,
ansiosos por que o organizador do préstito lhes entregue os diferentes
instrumentos e símbolos da Paixão de Cristo, que, em salvas de prata ou
bandejas, devem conduzir.
Vai
à frente o guião, empunhado por moço de forte pulso e, logo a seguir, as sete
insígnias, intervaladas por filas de anjinhos, o último dos quais – o anjo da
cruz - tem de ser menina robusta, para não soçobrar ao peso do santo lábaro em
todo o longo itinerário. Antigamente, incorporava-se também a Verónica, donzela
que concitava a admiração geral pela compostura e grave seriedade que tinha de
manter durante o percurso. Hoje as prescrições litúrgicas não permitem tal
figuração.
Após
as imagens de Nossa Senhora do Pé da Cruz e S. João, segue o palio, sob o qual
um sacerdote conduz o santo lenho, e, no couce da procissão, a filarmónica e a
grande massa dos fiéis. Assim organizado, entra o préstito na igreja Matriz
onde é pregado o sermão do Pretório, depois do qual a procissão sai pela mesma
ordem, seguindo então o andor do Senhor dos Passos à frente do de Nossa Senhora
e S. João. Em todo o trajecto, até ao regresso ao Calvário, ouvem-se os acordes
plangentes de sentidas marchas fúnebres. E os sinos não cessam de dobrar, até
que, no púlpito exterior do Calvário, o pregador encerra a solenidade
exaltando, em comovente oração, os merecimentos da Paixão do redentor.
A
segunda-feira de Passos, noutros tempos, era de folga nas oficinas e trabalhos
rurais. Nas escolas dava-se o mesmo porque, de costume, confessavam-se os
alunos nesse dia e visitavam depois a Senhora da Graça”.
Era
assim a Procissão dos Passos. Que começava, no dia anterior, à noite, quando a
imagem do Senhor dos Passos era conduzida, em camarim fechado, para a Igreja
Matriz e seguida por milhares de pessoas que com profusão de vela e tochas
davam ao préstito um grande cenário feérico e de religiosidade.
Ah!
E havia também as amêndoas, o visitar das montras, isto nos anos 60, o papeliço
(papeluço) das amêndoas para as namoradas...
Muitos
passos se davam em louvor do Senhor dos Passos. Passos para a vida, passos no caminho
do futuro.
E,
hoje?
Mário
Mendes – 11/3/2008