quarta-feira, 13 de julho de 2016

OPINIÃO: O património da Devesa

 O arranjo da Zona da Deveza-de-Traz já foi a reunião de Câmara e aprovado. Fazer bem ou menos bem é necessário. Como a Praça da Republica este espaço encontra-se desde há muito abandonado e maltratado. O piso em terra batida era o adequado para as grandes feiras de gado com origens perdidas no tempo, provavelmente desde as origens de Nisa-a-Nova.
Com o crescimento de Nisa, e consequente aumento da malha urbana, muitas vezes ao "sabor da maré" pelas vias viárias aparece a Rua Dr. Sidónio Pais, Largo da Cabine Eléctrica e Estrada de Montalvão.
A Tapada da Câmara, onde se situavam as nascentes da Fonte Nova, era a zona de trocas e vendas das vacas. Por serem perigosas, estavam confinadas a esta tapada. Nos restantes espaços os animais menos perigosos.
Toda a actividade desta zona girava em torno da agricultura. Era ver dezenas de carroças e carrêtas de bois paradas ao cair da noite.
Durante o dia só ficavam as que estavam em reparação ou construção, era uma grande azáfama, não olhando relógios nem dias de semana, guiava-nos a barriga e o sol. Trabalhadores rurais ao serviço dos "senhores" donos da vila, por ex., Dr. Jaime, o Dr. Basso. Também gente livre como pássaros que viviam de alguns poucos hectares de terra. Criavam dois ou três porcos que matavam nos dias frios de Inverno, as aves de capoeira, os derivados como o leite e os ovos
juntamente com os produtos da agricultura eram a sua "dieta" alimentar. Vender na Praça ás quintas e domingos dava-lhes algum dinheirinho que em tempos difíceis era religiosamente amealhado não viesse alguma contrariedade.
Ainda pode hoje ver-se tanto na Deveza-de-Traz como na Deveza-da-Frente algumas casas com duas entradas, a porta de entrada e um portão em arco e alto por onde carrêtas e carroças entravam carregadas dos produtos agrícolas, principalmente fenos.
Para dar suporte á agricultura havia toda uma série de serviços que se desenvolviam nas Devezas. Uns trabalhavam a madeira na forma mais tosca, outros faziam as rodas, cubos e raios; os ferreiros; cada um era especialista na sua área. Havia também armazéns de lenhas, azeitona e outras, cada actividade localizada na época do ano.
Na da azeitona havia vários pontos de recolha directa ao produtor que posteriormente a vendiam ao “negociante”.
Era vê-los juntos e felizes quando iam colocar o ar de ferro na roda de madeira e se deslocavam á ribeira na "Laje Branca", dia que jorraria algum vinho. Era vê-los passar para a Taberna da Charrinha, do ti “Emil Àrell" ou Cantinho da Sorte, com um quarto de pão, farinheira ou toucinho entre as 10 e 11 horas da manhã, onde iam beber o "canudo d´ametade".
Quero deixar aqui palavras de apreço e de reconhecimento àqueles que fazem parte das minhas memórias, das nossas memórias.
Desculpem-me pelo uso de alcunhas, pois, alguns não os conheço de outra forma.
Aos Metildes, Bresungas, Sem-Tripas, Galuchos, Marzias, Raniscas, Belonas, Mouras, Malinos, Polidos, Papa Leites, Freiras, Tuítas, Caritas, Paraltas, Certainhos, Salgueiros, Chorões, Cebolas, Freiras e a tantos outros.
Honra á vossa memória.
José Maria Moura in "Jornal de Nisa" - 8/10/2008